Nosso vaso
Era apenas um vaso
como tantos outros
que deitei o olhar num dia
em que a vida não me sorria
Não tinha um lugar certo
e nem siquer um dono
jogado ao canto esquecido
talvez por quem
não tenha dado o devido valor
Me aproximei dele
e o tomei nas mãos
estava muito maltratadinho
talvez abandonado pela sorte
Suas trincas e rachaduras
eram evidentes demais
mas guardava em seu
rico interior
uma terra ainda adubada
Peguei nele com carinho
quase como um abraço
e o ajeitei no cantinho
do meu coração abalado
E o levei pra minha casa
arejei bastante a terra
e plantei uma muda de rosa
vermelha e perfumosa
A plantinha cresceu
mas de seu caule
também vieram os espinhos
que fui arrancando um a um
a medida que brotavam
Talvez estivesse errando
em fazer tão vil ação
mas não queria que eles ferissem
também meu coração
E numa ensolarada manhã
um belo botão de rosa
despontou promissor
enchendo minha vida
de alegria e calor
E foi tanta espera
pela flor desabrochada
meu coração palpitava
ja quase desistindo,
pois que a rosa não se abria
nem ao raiar do dia
Percebo que ainda tarda a surgir
em todo o seu esplendor
mas para quem não tinha nada
e achou um vaso
apenas de terra adubada
agora tem também
a espera da flor,
numa promessa de amor
Santos, SP
28 de junho
2006
Em dueto com
***
Nossa flor
Eugénio de Sá
Já fui pau de cabeleira, estudante, reprodutor
Escrevi rimas de noticias, dei apoio a engenheiros
Desenhei caras e vicios, tudo sem grande fulgor
Experimentei a liberdade esculpida em cravos grosseiros
Dei amor e confiança a quem provou não merecer
Rompi sapatos já gastos em vãs procuras de sorte
Recebi dores e traições de quem não quis receber
Vagueei por esta vida não esperando mais que a morte
E eis que um vaso, um simples vaso
numa janela qualquer, despertou minha atenção
era um vazo como tantos, com rachas, num prato raso
mas dele brotava uma rosa, frágil flor aquele botão
E parecia bem tratada na terra que a acomodava
fresca a água que a regara, cujo escorrer se notava
Pensei então que essas mãos que bem tratavam a flor
poderiam ser aquelas que sem ser jovens e belas
saberiam dar amor a quem só viveu na dor
E a esperança encheu-me o olhar posto naquela janela
Lisboa
29 de Junho
2006
Guida Linhares
Enviado por Guida Linhares em 29/06/2006